Foi um destes sonhos de fim de tarde, onde o véu entre a vigília praticamente se rasga. E então lá estava eu, sentada em uma calçada úmida, de uma rua desconhecida e deserta de pessoas.
Garoava e o frio cortante assoviava pelos prédios, por entre as casas. A rua estava repleta de coisas pelo chão, como se um furacão houvesse arrastado tudo de dentro das casas e jogado aos quatro-ventos, pelas calçadas e avenidas, transformando tudo em um grande caos de livros, roupas e miudezas.
Olhei para a bagunça e então pessoas começaram a surgir de dentro das casas e começaram a vasculhar o chão, com rostos perdidos e confusos. Seus andares eram arrastados, cansados.
Um assovio ao meu lado me obrigou a virar-me e vi uma senhora idosa que vinha em minha direção. Arrastava um saco de catadora repleto de coisas, sorrindo de modo tranquilo.
"O que aconteceu aqui?" Perguntei quando a tive a meu lado.
Ela olhou para a rua, para as pessoas que pareciam mortos-vivos.
"Elas estão procurando coisas que perderam. Tudo o que é perdido vem parar neste lugar."
Olhamos ambas para um homem que olhava para uma pilha de lixo de modo desanimado. A senhora tocou meu braço de modo leve.
"O que você perdeu?"
Pega de surpresa a encarei. Seu rosto parecia mudar a todo instante. Mais jovem, mais velha.
Desviei meu olhar para o céu nublado.
"Não sei. Não lembro."
Ela assentiu como se entendesse: "Quase ninguém lembra."
"Por que eles vêm, então?"
"Porque sentem falta." Ela deu de ombros. Agora não passava de uma menina. "No fim estão todos perdidos também."
Assenti, mesmo sem entender ao certo. A chuva continuava a cair e me vi em meio àquela grande pilha de achados e perdidos, sem saber o que estava procurando até acordar.
Talvez, eu também estivesse perdida.
Lorem Krsna