sábado, 19 de setembro de 2020

Infecção

 A forma como eu assimilo um dano é muito louca.

Eu nunca processo de imediato, por isso a primeira reação sempre é muito fria, como se não tivesse sido nada. 

Dependendo do que for, eu consigo fazer o que for preciso no piloto automático até o pior da situação passar. 

Geralmente, só então, eu começo a processar. Sozinha.

E a primeira reação nunca é tristeza, mas ficar puta. Com raiva. Mas é aquela raiva silenciosa, a mais perigosa. E se não tem ninguém a quem direcionar a raiva, eu internalizo.

(Como resultado eu, no fundo, estou sempre com raiva. Tem raiva de anos que nunca deixei sair. Meus dentes se desgastam, meu músculo masseter hipertrofia, minha atm se fode. Sempre que um pouco daquilo sai, meu coração parece que vai sair pela boca. É tanta raiva que tem que sair de alguma forma. )

Chorar é a última parte do processo, mas é tão reprimido que passa em menos de um minuto e fica aquela sensação de que você começou a drenar um abscesso e parou no meio do caminho. Saiu um pouco da secreção, você sutura e manda para casa. Sem dreno, sem tirar tudo. Aquilo infesta dentro de vocês, deixa de ser local e vai invadindo outros tecidos. Sistematiza. 

Meu ciclo de dano sempre fica incompleto. 

Eu tenho a sensação que se for fazer terapia, que se um dia me abrirem para cuidar dessa infecção, eu vou me desmanchar em pus.


Lorem K Morais


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